Por Lucas Mello Braga
Não é novidade para ninguém que a educação brasileira passa por um processo de transformação e readequação as novas necessidades do desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Se no governo Fernando Henrique a luta dos estudantes era orientada pela bandeira “Vamos barrar essa reforma”, hoje, barrar a reforma universitária significa enfrentar de forma fragmentada diversas iniciativas do governo de reforma universitária: o REUNI, em 2007, Fundações Privadas, Lei de Incentivo Tecnológico, avanço da EAD, MP 520 e criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, e muitos outros decretos, medidas provisórias ou projetos de lei que visam reestruturar a educação, no sentido de aprofundar a sua relação direta com o mercado.
Essas reformas não só afetam a qualidade do ensino e as condições de manutenção dos estudantes na universidade, mas precarizam o trabalho docente e dos técnicos administrativos com a destruição da carreira, condições de trabalho cada vez piores, terceirizações e aumento dos concursos para temporários. Os estudantes, formados a partir das necessidades do mercado, sofrem cada vez mais com trabalhos em condições precárias.
Em 2011, ano de muitas lutas dos estudantes (mais de 15 ocupações de reitorias), também os servidores entraram em greve. A resposta “democrática” do governo é se negar a negociar e judicializar a greve. Os professores, também em campanha salarial, tiveram o aumento emergencial de 4%, acordado, que não se concretizou mais de 9 meses depois. O agravamento dessa situação chegou com peso total nesse ano. As mobilizações do ANDES-SN e suas seções sindicais, somam às mobilizações dos servidores e dos estudantes.
Hoje, mais de 40 universidades já se mobilizam para uma greve que vai parar a educação no Brasil e muitas outras universidades em greve estudantil, como a UFF, UFLA, UFU, UFRRJ, entre muitas outras, além dos processos em curso. A resposta do governo já chegou. Na última semana, o reajuste do salário dos professores virou uma MP além das propagandas no horário nobre sobre os “avanços no ensino superior”.
Ainda, não houve, desde 2010 qualquer avanço na principal pauta de reivindicação dos docentes – a reestruturação da carreira:
“Para reestruturação da carreira atual, desatualizada e desvirtuada conceitualmente pelos sucessivos governos, o ANDES-SN propõe uma carreira com 13 níveis, variação remuneratória de 5% entre níveis, a partir do piso para regime de trabalho de 20 horas, correspondente ao salário mínimo do DIEESE (atualmente calculado em R$2.329,35) A valorização dos diferentes regimes de trabalho e da titulação devem ser parte integrante de salários e não dispersos em forma de gratificações” (Nota à sociedade brasileira – Comando Nacional de Greve).
A tentativa de esvaziamento da pauta da greve da educação é na verdade, a vontade de esconder que o projeto de educação do governo é oposto ao da comunidade acadêmica.
Se a universidade se precariza hoje, do ponto de vista do projeto do governo, é um mal aceitável e até já previsto, desde que a universidade ajude a “desenvolver o Brasil”. Desenvolver também significa alteração no código florestal, construção de Belo Monte, megaeventos voltados para o lucro das empreiteiras, criminalização da pobreza.
Nós, estudantes, fizemos nos últimos anos ocupações de reitorias, greves, paralisações, enfrentamento ao projeto de educação implementado a partir dos seus reflexos no dia a dia dos estudantes. Entendemos que a greve em curso não é só a greve pelo plano de carreira e melhores condições de trabalho para os professores. Essa greve é a greve por bandejão em cada campus nas universidades pelo Brasil, por democracia, contra os cursos pagos, por assistência estudantil, por mais salas de aula, laboratórios, bibliotecas. A tarefa dos estudantes não é só apoiar a greve dos professores, mas somar com um conjunto de reivindicações específicas de cada curso, pela disputa de projeto de educação democrático e socialmente referenciado em cada universidade, inclusive aprovando greve estudantil nas universidades em que for possível.
A disputa desse projeto de educação hoje é muito relevante, não só pelo crescimento das mobilizações e da greve, mas pelo seu caráter de enfrentamento geral as políticas neodesenvovimentistas implementadas pelo governo Dilma. A greve que hoje cresce nas universidades federais precisa ser ampliada para uma mobilização geral da educação pública, somando as lutas dos profissionais da educação em todos os estados, contra o fechamento de escolas na rede estadual e no campo, contra a transferência de recurso público para a iniciativa privada e privatização das universidades por dentro, via Fundações de Apoio e cursos pagos. Um projeto que garanta 10% do PIB para educação pública, a valorização do trabalho docente e técnico administrativo, condições de estudo e assistência estudantil, um projeto de educação voltado a transformar a realidade brasileira e não aprofundar suas desigualdades.
Lucas Mello Braga é estudante de Direito da UFF e diretor de Universidades Públicas da UNE